Presenciei ao vivo essa mulher vibrante em Sampa, no show Falso Brilhante, em fevereiro de 1976..A.música foi feita por Chico Buarque e Francis Hime e não fazia parte do repertório do referido show. Essa canção -" uma das mais poderosas e dilacerantes letras de amor e ódio da música brasileira"- me remete a alguns poucos e intensos momentos "altamente fossídicos" em meus tempos de "coração sequestrado"...rsrs
Tom e a canção antológica que um dia "embalou" uma linda história de amor!
A história de Ligia contada ( e adaptada) em prosa...
1968, Ipanema, no Veloso...Tom Jobim e o fotógrafo Paulo
Góes, deparam-se com duas lindas moças na varanda do bar e se aproximam. Uma
delas, Lygia Marina de Moraes, jovem muito bonita, sobrinha de Vinicius de
Moraes, diz a ele que é professora do
pré-primário de uma de suas filhas, ao que o músico dispara: “Nunca vi uma
paquera transformar-se em reunião de pais e mestres”!
Lygia, muito tempo depois, veio a
saber, surpresa, que ela fora inspiração
para uma das mais belas canções (Ligia)
do cantor e compositor, também cantada por Chico Buarque, pela primeira vez, em
1974, em Sinal Fechado.
Ela se casou com o cineasta Fernando Moraes, com quem
ficara por dez anos – nessa ocasião Tom estava casado. Depois, separada, casou-se
com outro Fernando, o escritor Fernando
Sabino, com quem ficou por doze anos –muito amigo de Tom. Ele só revelou que
ela fora sua musa inspiradora depois que
estava separada de Sabino claro, em
consideração ao amigo! Nessa
ocasião, quando soubera disso, Lygia apenas comentara que ele fora um dos homens mais bonitos do
Brasil e que ela ficara em transe ao conhecê-lo pessoalmente naquela tarde fria
e chuvosa, no conhecido bar, no Rio...rsrsrsrs.
Mas a Lígia ( essa
leva acento no primeiro i ) a
quem me reportarei a seguir
é personagem de uma história que
tem como cenário uma charmosa cidade do sul de Minas, cercada de montanhas e
águas milagrosas.
Era uma moça tímida, não tão cheia de belos atributos,
com olhos negros e cabelos idem. Lígia estava
a passeio com a família, naquele reduto muito bem frequentado por interessantes e bem-nascidos “cariocas”.
Costumava passar as férias de julho naquela cidadezinha mágica...rotina de
vários anos. Contava ela então com 17 anos. Gostava de praia, gostava de sol e
quando ia ocasionalmente ao Rio,
costumava andar pela orla de Copacabana até o Leblon. Tinha alma
romântica, gostava de cinema e era impregnada pela música ( e amava samba!).
E um dia, Renato, carioca, conheceu Lígia. Dez anos mais velho,
costumava arrancar suspiros das mulheres por onde passava. Vislumbrou-a no
clube, depois de um jogo de vôlei com a turma e, com Lígia,
deslumbrou-se. E desde aquele momento, ela impregnara suas retinas, seu corpo, seu coração. Nada
sabia dela, sequer o nome. Não gostava
ele de praia nem de cinema...não gostava de sol! Nunca sonhara com ela, pois não fazia o seu
tipo. Mas ela mexera de alguma forma com ele.
Em uma noite, na “balada” do hotel da cidadezinha onde
ela, há muitos anos, costumava se hospedar
com a família, os olhos de Lígia cruzaram os de Renato. Ele, estudante de Direito, no auge dos seus
1,90m, pele clara, olhos verdes, músico,
filho de um general,dela se aproximou,
acompanhado por dois seguranças .
E, juntos, dançaram a noite toda para
depois não mais se desgrudarem naquela
temporada.
Pois bem, olhos nos olhos, embalados pelas lindas
melodias da década de 70, os dois iam se entremeando no jogo de olhares,
dançando a noite toda , de uma forma
inesquecível, chamando a atenção de todos ao redor. Ela estava ricamente adornada, vestida
entre exótica e exuberante, ao que ele muito elogiara e o fascinara, a
princípio. E, a despeito de seu jeito
tímido, Lígia era uma moça de atitude e bastante interessante, segundo diziam
os que a cercavam de muitas atenções. Talvez fosse isso o seu trunfo para que
muitos a achassem bonita, coisa que ela
sempre soubera não ser. Talvez por ter tanta coisa a dizerem um ao outro é que
o tal “romance” perdurou por um bom tempo, como foi a seguir, após aquela mágica noite.
E ela se encantara por ele, apesar de muito estranhar os
dois brutamontes “blindando-os” o tempo
todo.
E ele se viu
envolvido pelos braços serenos de Lígia. E se rendeu a ela, a despeito se seus
olhos morenos meterem-lhe mais medo que um raio de sol.
E ele fez uma
serenata - cantou "Ligia" pra ela! - , embaixo da janela do quarto dela no hotel, sob o
olhar cravado e inquisidor do pai dela.
Mantiveram o “enlace” por dois anos, apesar da distância, dos 600 km que os separavam. Eram telefonemas e telefonemas - todos no domingo à tarde, quando ambos não se
viam na cidadezinha turística. Ela, convidada por ele e sua família, fora ao seu encontro, em certa ocasião, no Rio,
onde ele morava -em um tríplex, no Leblon-,
sob o consentimento e tutela tanto dos pais dele quanto os dos
dela, que muito faziam “gosto” de que os
dois ficassem juntos, apesar da diferença de idade entre eles.
Lá, ele lhe apresentara
um outro universo e, com ele,
pôde aprender coisas incríveis. E ela entendeu o porquê de ele e toda a sua
família serem cercados pelos seguranças
– os tais "brutamontes" a que ela se referia, rindo muito - e a vida tão diferente que ele e a família levavam por conta do
“status” do pai o que, posteriormente , contribuiu para que ela dele se
desencantasse...ou não teria sido amor?
Eram cartas e cartas todas as semanas! Cartas aguardadas ansiosamente por eles.
Cartas imersas, hoje, dentre tantas outras relíquias, no baú de Lígia. Cartas essas, amareladas pelo tempo, com gosto de uma linda
história de amor, permeadas de lindas
descobertas, de escritas inteligentes, fascinantes – "ridículas" cartas de amor, não seriam cartas de amor se não fossem ridículas como
diria Pessoa!?!-, que trazem à tona uma
época em que a comunicação, apesar de
tão retrógrada para os dias de hoje, fazia aproximar tão
calorosa e tão lindamente as pessoas...registros preciosos de uma áurea época
que colorem vibrantemente, hoje, a fria e
cinza tarde nesta estação do ano.
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- Todas as cartas de amor são
- Álvaro de Campos, 21-10-1935
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)
Créditos